Emma Goldman

Emma Goldman (Kaunas, 27 de junho de 1869 — Toronto, 14 de maio de 1940) foi uma anarquista conhecida por seu ativismo, seus escritos políticos e conferências que reuniam milhares de pessoas nos Estados Unidos. Teve um papel fundamental no desenvolvimento do anarquismo na América do Norte na primeira metade do século XX.

Nascida em Kovno, no Império Russo (atual Kaunas, na Lituânia), Goldman emigrou para os Estados Unidos da América em 1885 e viveu em Nova Iorque, onde conheceu e passou a fazer parte do florescente movimento anarquista.[1] Atraída pelo anarquismo após a Revolta de Haymarket, Goldman tornou-se uma renomada ensaísta de filosofia anarquista e escritora, escrevendo artigos anticapitalistas bem como sobre a emancipação da mulher, problemas sociais e a luta sindical.[1] Ela e o escritor anarquista Alexander Berkman, seu amante e companheiro por toda vida, planejaram assassinar Henry Clay Frick como uma ação de propaganda pelo ato. Embora Frick tenha sobrevivido ao atentado, Berkman foi sentenciado a vinte e dois anos na cadeia.[2] Goldman foi presa várias vezes nos anos que se seguiram, por "incentivar motins" e ilegalmente distribuir informações sobre contracepção.[3] Em 1906, Goldman fundou o jornal anarquista Mother Earth (Mãe Terra).[4]

Em 1917, Goldman e Berkman foram sentenciados a dois anos na cadeia por conspirarem para "induzir pessoas a não se alistarem" no serviço militar obrigatório, que havia sido recentemente instituído nos Estados Unidos. Depois de serem soltos da prisão, foram novamente presos - junto com centenas de outros progressistas - sendo deportados para a Rússia. Inicialmente simpatizantes da Revolução Bolchevique daquele país, Goldman rapidamente expressou sua oposição ao uso de violência dos sovietes e à repressão das vozes independentes. Em 1923, ela escreveu sobre suas experiências entre os bolcheviques, dando forma ao livro Minha Desilusão na Rússia (My Disillusionment in Russia). Enquanto viveu em Inglaterra, Canadá e França escreveu uma autobiografia chamada Vivendo Minha Vida (Living My Life).[5] Com o início da Guerra Civil Espanhola, em 1936, Emma, já com mais de 60 anos, viajou até a Espanha para apoiar a Revolução Anarquista.[6]

Durante sua vida, Goldman foi celebrada por seus admiradores, como uma livre pensadora e "mulher rebelde", e achincalhada pelos adversários, como sendo defensora de assassinatos políticos e revoluções violentas.[7] Seus escritos e conferências abrangeram uma variedade de assuntos, incluindo o sistema prisional,[8] ateísmo,[9] liberdade de expressão,[10] militarismo, capitalismo,[11] casamento e emancipação das mulheres. Também desenvolveu novas formas de incorporar políticas de gênero no anarquismo.[12] Emma Goldman faleceu na cidade de Toronto, no Canadá em 14 de Maio de 1940.[13]

Após décadas de obscuridade, nos anos 1970 a vida e a obra de Emma Goldman voltaram a ser reconhecidas na medida em que acadêmicas, feministas e anarquistas passaram a se interessar por ela. Este interesse implicou em uma nova onda de divulgação de seu legado, com publicações de seus artigos e livros sendo relançados, e citações e imagens suas sendo estampadas em camisetas e cartazes.

É creditada a ela diversos ditos marcantes do anarquismo entre estes a famosa frase que diz - "Se não posso dançar, não é minha revolução" - capaz de definir de maneira simples a ideia anarquista de liberdade.[14]

Adolescência

Quando Emma era adolescente, a família Goldman mudou-se para a vila de Papilė, onde seu pai passou a administrar uma taberna. Enquanto suas irmãs trabalhavam, ela se tornou amiga de um servente chamado Petrushka, que estimulou nela as "primeiras sensações eróticas".[24] Posteriormente, ainda em Papilė, ela testemunhou um camponês ser açoitado com um chicote em praça pública. Esse evento a traumatizou e contribuiu para o desprezo pela violência das autoridades, que iria marcar toda a sua vida.[25]

Aos sete anos, a família Goldman se transfere para a cidade prussiana de Königsberg (então parte do Império Alemão), onde Emma foi matriculada em um colégio secundário estatal. Um de seus professores, especialmente cruel em punir os estudantes desobedientes, tomou Emma como alvo preferencial, batendo em suas mãos com uma vara. Outro professor tentou molestar suas estudantes mas acabou sendo despedido quando Emma passou a enfrentá-lo. No entanto, entre os docentes da escola, ela encontra um professor de língua alemã que lhe demonstra simpatia, emprestando-lhe livros e até mesmo levando-a a uma ópera. Estudante apaixonada, Goldman passou no exame de admissão ao ginásio, mas seu professor de religião se recusa a providenciar um certificado de bom comportamento, impedindo que ela fosse aceita.[26]
O Romance de Nikolai Chernyshevsky O Que Há Para Ser Feito?, uma inspiração poderosa durante toda trajetória de Goldman.

A família muda-se novamente, dessa vez para a cidade russa de São Petersburgo, onde seu pai abre uma loja após outra, falindo diversas vezes. A pobreza que se abateu sobre a família forçou os filhos a partirem em busca de trabalho. Emma trabalhou em vários lugares, incluindo uma loja de espartilhos.[27] Ainda adolescente, implorou para que seu pai lhe permitisse voltar à escola, mas, em vez disso, ele atirou um de seus livros de francês no fogo e gritou: "Garotas não precisam aprender muito! Tudo o que uma filha judia precisa saber é como preparar Gefilte fish, cortar bem o macarrão e dar ao homem muitas crianças."[28]

Sem poder frequentar a escola Emma Goldman buscou educar-se por conta própria. Logo começou a estudar a agitação política do contexto em que vivia, particularmente os niilistas responsáveis pelo assassinato de Alexandre II da Rússia. Aquele movimento intrigou-a, mesmo não conseguindo compreendê-lo completamente naquela época. Quando leu o romance de Nikolai Chernyshevsky O Que Há Para Ser Feito? de 1863, ela finalmente encontrou na protagonista do livro, Vera, um modelo a ser seguido. Vera adotara a filosofia niilista, escapando de sua família repressora para viver livremente, criando uma cooperativa de costura. O livro cativou-a e permaneceu como uma fonte de inspiração durante toda a sua vida.[29]

Enquanto isso seu pai persistia em planejar para Emma um futuro como dona de casa e tentou arranjar-lhe um casamento quando ela completou quinze anos. Naquele período pai e filha passaram a brigar constantemente: ele reclamando que ela estava se tornando uma mulher "perdida", e ela insistindo que apenas se casaria por conta própria e por amor.[30] Na loja de espartilhos, Emma era forçada a escapar das investidas indesejáveis dos oficiais russos e de outros homens. O mais persistente deles levou-a a um quarto de hotel e cometeu o que Goldman chamou de "contato violento";[31] Dois biógrafos chamam isso de estupro.[30][32] Ela ficou perturbada com a experiência, arrebatada pelo "choque da descoberta de que o contato entre um homem e uma mulher pudesse ser tão brutal e doloroso."[33] Sentiu que aquele encontro para sempre pesaria sobre suas relações com os homens.[33]